segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Nova York em pedaços

Nova York é de todos, mas é para poucos.

Nova York é fantasia, é filme, é cena de televisão. É café em cada esquina, não é violenta, é segura. As pessoas andam, o metrô funciona, as lojas estão abertas aos domingos. Os restaurantes não são caros. Come-se bem, vive-se bem, sonha-se melhor ainda....

.... porque Nova York, quando é real, não sobra muito. Não te deixa ficar doente, não te deixa parar. Mas ao mesmo tempo te deixa ser enquanto se está mal.

Nova York está aberta para todos, mas poucos vivem

Nova York é Manhattan, é a pontinha do Brooklyn agora que investidores resolveram ganham dinheiro nas bordas dos rios. Nova York é pequena, é chique, é elegante.

Até o momento em que você vê mulheres andando de salto alto, até o momento que você precisa pegar o metrô às seis da manhã para trabalhar ou ficar esperando o metrô às quatro da manhã porque o táxi se recusa a ir até a sua casa.

Nova York é uma imensidão de coisas que foge dos olhos.

Nova York se divide entre os que podem tudo e os que servem aos poucos que decidem.

Há aqueles que advogam por uma Nova York mais igualitária, há os que acham que o dinheiro manda e que a vida é assim mesmo. Há os que trabalham, há os que simplesmente têm dinheiro.

Em Nova York se paga 5 dólares por uma boa comida. E entre milhões de refeições de cinco dólares, há gente que paga 500 dólares por um prato, não come tudo e joga fora o que sobrou. Há gente que ajuda, há gente que atrapalha, gente que finge que ajuda e gente que adota cachorro de três patas.

Nova York é vaidosa. O feio é bonito, o bonito incomoda o antigo. O novo destrói o seu redor. Parques saem do chão, ajudam a sentir a desigualdade nos primeiros meses antes que a grana destrua tudo ao redor. Tudo fica de vidro, transparente. A rua é de todos, mas o vidro é dos que pagam a tarifa.

A gente caminha na sombra porque o vidro, ainda que transparente, consegue tapar o sol. Aqui o sol é de poucos. A rua, de todos. Desde que você siga as normas e expectativas do que se espera dos que podem caminhar livremente.

Todos andam, muitos são parados. Sem motivo. Nova York é abandono do Roberto Carlos. Nova York dói nos que se deixam sentir. Mas te faz gozar quando os que doem te fazem sentir.

Há gente que advogue por uma Nova York secreta, aquele em que vivemos, longe dos grandes salários. Nova York é boa porque há espaço para todos, me parece. Nova York é “nem luxo, nem lixo”. É a minha vida, fora do centro, trabalhando no centro, procurando teatro nas laterais.

Dá para ser feliz aqui. Se você sabe amar o que está no meio.

Nova York, me parece, é ideal para quem sabe amar o que não é óbvio. E para quem sabe deixar o óbvio surgir sem vergonha. A cidade não dói, te faz doer. Mas para quem sabe dizer ‘fuck you’ na hora certa.

Muita gente deixa Nova York, outros insistem, mas todo mundo tem vontade de sumir de vez.

Acho que a Rita Lee estava em Nova York quando escreveu “Shangrilá”.





2 comentários:

  1. Em muitos momentos me pareceu estar lendo sobre SP...

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    1. Pois é.... quando eu reli, pensei no mesmo. Este texto foi uma colagem do meu caderninho de metrô.

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