segunda-feira, 14 de julho de 2014

Esse mundo.....


Acho estranho falar de gente famosa usando só o primeiro nome como se fosse íntimo, acho mais estranho ainda chamar alguém de amigo quando você só viu a pessoa uma vez ou pior, nos dias de hoje, quando você nunca viu.

Acho brega dizer que adora o Caê, o Gil, a Gal, para mim eles são o Caetano Veloso, o Gilberto Gil e a Gal Costa, nunca os vi, e não sei se eles me dariam permissão para chamar pelos apelidos.

Eu me lembro de um dia que estava num restaurante e um amigo disse, “olha, o gianni está aqui”, eu entendi Jean e perguntei quem era, meu amigo, bravo, muito bravo me chamou de arrogante e disse que eu era um besta que adorava novela e fingia que não sabia quem era o Reinaldo. “Que Reinaldo?” Meu amigo nunca entendeu que não é arrogância, é vergonha mesmo. Para mim, aquela pessoa é o Reinaldo Giannechini, ator de novelas (que, sim, adoro assistir). Ele no restaurante é um pessoa que eu não conheço.

Eu também não sei se famosos são vaidosos ou não, portanto não me dirijo a eles como se fossem íntimos dizendo que adoro o trabalho deles. Não sei quem são. Eu conheço a obra. Há uns que gostam de serem reconhecidos, mas com o risco de  passar vergonha prefiro manter-me na minha arrogância usual. Sei lá... a gente mede os outros pelo nosso metro, não? Eu detesto intimidade com gente que não conheço, me arrepia o cabelo quem me chama de “Ju” sem me conhecer direito, pois então parto do princípio que pessoas conhecidas não querem falar com estranhos no meio da rua, não?

Também, sempre acho ridículo essas pessoas que choram, que gritam, que saem correndo, que fazem de tudo por gente que não conhecem. Eu choro com livro, filme, com obra, mas nunca com o artista. Acho meio problemático, na verdade. Mas aí, tem aqueles momentos que a gente tem que fingir que não chora....

Hoje morreu a Vange Leonel. Na minha adolescência cool eu adorava suas músicas, e adorava citar “Esse mundo” como uma música super gay. Li seus livros, e acompanhei a sua coluna na folha. E resolvi citá-la na minha tese ao falar de literatura lésbica (perdoem a simplificação, não é hora de teoria, é hora de choro disfarçado). Fiquei meio triste porque é uma pessoa que admirava muito. Quer dizer, uma artista, porque como pessoa não sei quase nada dela. Não é minha amiga, não é a Van... é a Vange Leonel.

E, no meio desses pensamentos, eu tive que voltar para a tese e mudar os verbos “She is...” para “she was...”, e dá aquele aperto na garganta.... mas tão cedo. A gente só chora quando a Globo coloca música triste, quando faz reencontro, mas assim do nada, de gente que não conhecemos, me parece estranho. É pela obra, talvez....

Essa é a coisa de tese que lida com gente viva, de repente, no meio da tese, antes da defesa, ela morre. Nem deu tempo de mandar para ela o trabalho pronto e dizer para ela, “Olha, Vange Leonel, você virou citação! Não é o máximo? Sei lá, eu acho o máximo, sonho de todo intelectual é virar citação!” Fica para próxima.

Eu não me arrependo de nunca ter falado com ela, de não ter foto para postar, dizendo, “saudades, grande”, “perdemos uma grande...”, ou algo assim. Essas manifestações públicas eu acho brega... o meu texto, não....

Ela ainda é Vange Leonel, eu não adorava a Vange, eu respeitava a Vange Leonel que morreu rápido demais para deixar uma obra mais consistente, maior, para termos mais coisas para ler.

O trem partiu, Vange Leonel. Boa viagem! Eu, desse lado do trem, vou tentar continuar brigando um pouco pelos nossos direitos e pode deixar que será em plena luz do dia! 

quinta-feira, 10 de julho de 2014

Bode do facebook

Lembra daquela festa de adolescente que a gente tinha dúvida se ia, acabava indo, se arrependia, mas ficava até o final na esperança de que algo fosse acontecer?
Naquelas festas que você via um grupo de pessoas que realmente se divertiam e você não conseguia entender bem o por quê? Talvez você fosse uma dessas pessoas, e provavelmente nem sabe do que estou falando, mas quem me conhece sabe que meu apelido de “garoto enxaqueca” em todos os anos da escola não foi de graça.

Facebook. Essa onipresente mídia é aquela festa. Cheia de gente que você mal conhece, com uns dois ou três amigos que você realmente quer interagir e mais um monte de gente que você vai conversar por dois minutos, achar que fez amizade e nunca mais ver e mais aqueles dois que vão ser simpáticos com todo mundo, falar com todo mundo e dizer que foi a melhor festa do ano...

O facebook é uma representação virtual daquela festa. E se naquela época aquilo já me enchia o saco, hoje, a paciência é zero. 

Acho que o estopim para mim foi sair para jantar com amigos e as pessoas que me convidaram passarem a noite com o celular no mão, olhando celular e comentando sobre as fotos de pessoas que eu não conhecia... Já passei por situações piores, com um amigo de amigo jantando na casa da minha mãe com o garfo numa mão e o celular na outra. E tenho certeza que todo mundo já passou por algo assim.

Lembra da festa?  A gente chegava, “dava uma geral para ser visto e depois ia para um canto”? Check-in.
Alguém em sã consciência já parou para pensar na inutilidade social do check-in? Quem ganha? As empresas. Como sempre. A marca ganha visibilidade. Empresas faturam e o dinheiro virtual circula por poucas mãos reais....
Em uma escala de inutilidades, o check-in é provavelmente a coisa mais ridícula que existe no facebook: aeroporto, hospital, restaurante.... Eu ouvi a desculpa de que “era para avisar minha família”. Lembra-se do telefone? Whatssapp, mensagem de texto... Ainda há espaço para privacidade. Os seus 3293 "amigos" não são a sua família.  Essa necessidade exacerbada de mostrar, ser, ter, estar está passando dos limites. 

Eu não me conecto no facebook pensando “o que será que fulano está fazendo...”. Não faz sentido. Para mim, não faz. Eu ainda busco ideias... acho...

O que mais me incomoda no facebook é o armário gay (mesmo quando não falo do assunto, acabo voltando para o mesmo tema...). Vejo muitas pessoas que postam tudo, onde estão, o que fazem, o que comem, comentários idílicos, mas não colocam foto com namorado,  fazem check-in em todas os lugares da cidade, menos nos bares gays, tiram fotos com todos, menos com os amigos gays... isso me enfurece. Por que, além de tudo, o facebook colabora com mais uma forma de repressão pessoal. Eu me lembro da parada gay em São Paulo há dois anos, a tensão nos olhares de muitos conhecidos quando fiz “check-in” (uma pesquisa antropológica, claro). Não marquei ninguém, apesar da vontade...

Pronto já fiz meu desabafo arco-íris...

De volta ao check-in:

Meu último check-in foi um teste de paciência e arrogância, estava lendo um texto da Lígia Clark com o Carlito Carvalhosa. Ponto. Esse check-in é arrogante, assumidamente, mas ninguém se interessa. Assim como ninguém se interessa em saber que estamos no aeroporto. Foi o meu último teste. O check-in nada mais é do que prova de que se pode fazer algo, ou seja, pode-se consumir. É muito mais simples do que querer que as pessoas saibam onde estão. Se ninguém se interessa em saber o que estou lendo e com quem, por que tem que se interessar em saber em que aeroporto estou (não vou nem comentar os check-ins de sala vip....) Na verdade vou comentar, sim: A mesma pessoa que faz check-in de sala vip ficou criticando o tal do rei do camarote. Incongruência? Ou simplesmente estupidez? 
Talvez existam check-ins que não sejam tão abnóxios (acabo de descobrir que é uma palavra em português!), vou pensar em alguns e se chegar em alguma resposta, eu digo. 

Eu me lembro de uma época que eu pensava, "nossa, tal pessoa esteve em NY, poderia ter me procurado", mas a realidade é que me procuram as pessoas que me procurariam se eu morasse no Brasil, na China ou em uma missão lunar. Hoje eu acho super chique descobrir que pessoas estiveram aqui e eu nem fiquei sabendo. Discrição ainda é a coisa mais elegante do mundo. 

Estamos no auge da propaganda, da mais do que batida máxima “você não sabe o que precisa até descobrir que existe”. E enquanto vamos descobrindo nossas novas necessidades, o facebook vai ganhando dinheiro....

O que muita gente esquece é que, diferentemente das festinhas de antigamente, o facebook deixa rastros, uma marca permanente no seu passado (mesmo quando você apaga algo, fica arquivado em algum depósito gigante em algum país que cobra poucos impostos). Aquele curtida no texto do Diogo Mainardi, aquela compartilhada em uma notícia falsa, aquele comentário quase racista que você se arrependeu, aquela falta de check-in na parada gay depois de fazer check-in até do banheiro, essas críticas baseadas em 140 caracteres... tudo lá.

Estou numa fase de “bode total”, o facebook tem trazido à tona esse meu lado “garoto enxaqueca” que andava adormecido, especialmente porque eu comecei a perceber a perda de assuntos com muita gente que não desgruda o celular, ou melhor, não desgruda o facebook do celular. Não vou propor a eliminação total das mídias (o meu lado ditador ainda está adormecido), mas uma certa reflexão talvez. Eu tenho certeza que o uso exagerado do facebook emburrece, sim. E muito. Se o seu assunto tem se limitado a fotos dos outros, você está se transformando naquele clássico personagem que passa o dia na janela fazendo fofoca.

Eu dei o primeiro passo de saída da festa, retirei do celular, do ipad e só olho uma vez por dia no computador.
Hoje acho que o facebook não serve para nada, a não ser para vender coisas. Vender sonhos, vender inveja, e vender produtos. Enquanto, nós, estúpidos mortais vendemos a ideia de que somos felizes, várias empresas vendem milhões de produtos que nos fazem acreditar que somos felizes. E a vida feliz segue.



Em tempo: enquanto postava esse texto, li duas reportagens interessantes. Ainda há espaço para vida inteligente, ainda...

Em tempo 2: Check-in em uma guerra. Momento único. Check-in em tragédia natural, "Sobrevivi ao tsunami, gente, estou bem", esse também seria válido. E acho que check-in no jogo do Brasil e Alemanha, momento histórico... "fudeu, galera" + fotinho com V de vitória.... E se acontecesse um apocalipse zumbi, nos primeiros dias eu tirava umas fotos com uns zumbis, se eu sobreviver ao apocalipse, claro.