Pois, a partir, de hoje, repenso os rumos desse blog mais uma vez e decido que vou simplesmente escrever, ou tentar...
Bem, depois de mais um tempão longe, resolvi escrever de novo e agora sobre a minha relação de amor e ódio com os turistas brasileiros em Nova York. Espero que gostem (ou odeiem).
João pagando de turista I |
Depois de
quase cinco anos em Nova York, posso dizer que já vi muita gente passando pela
cidade, seja de férias, seja fazendo curso, seja se escondendo..... e eu fui
ficando por aqui. E fui coletando histórias de gente que passou por aqui. Muita
coisa boa de lembrar, mas muita coisa que dá uma vontade de rasgar o RG.
Nova York –
e os Estados Unidos de uma maneira geral – causa uma certa fascinação entre os
brasileiros. Não é de se espantar, por muitos anos este país tem sido o modelo
econômico e social para muita gente no Brasil. Viver o sonho americano através
dos filmes e dos seriados de televisão acabou se tornando, até uma certa
medida, o próprio sonho brasileiro. E muitos vêm para cá com esperança de
reproduzir aquela pequena cena de seriado ou aquele pequeno memento de um filme
quase inesquecível.
Acho que
tudo bem... não sei.... morar aqui me deixou meio cínico e cético, como disse
um amigo meu, os Estados Unidos me transformaram em um comunista. Nem tanto,
mas há momentos em que conviver com brasileiros por aqui dá vontade de fugir
para uma ilha e esconder minha nacionalidade.
Eu não sei
escrever muito bem, não sei escrever blog, não sei escrever “posts” bem sacados
no facebook, por isso resolvi
preparar este pequeno texto para dividir algumas angústias que passei por aqui.
Pensei em uma lista porque me parece que está no moda no mundo virtual. As
pessoas leem mais facilmente, se reconhecem, dão risada e passam adiante, mas
não sei fazer listas. Pois então: Por mais simples ou blasé que seja este texto,
posso garantir que tudo que está relatado aqui é a mais pura realidade, como no
show de Truman, ou melhor, como tudo que se passa neste país que serve de
modelo agridoce para nossa abastada sociedade brasileira.
Pois, este
texto nasce de uma frustração, ou várias frustrações que surgem enquanto
convivemos com compatriotas em terras ianques. Modelos de comportamento que se
não são comuns, marcam, pelo menos, uma certa tendência entre nós atualmente.
A sensação
que tenho é que brasileiros, mais do que americanos ou outras nacionalidades
que tenho convivido por aqui querem fazer o máximo possível, da maneira mais
rápida possível. Seja essa maneira
eficiente ou não. Isso não é importante para nós, mas que seja feito, ou
melhor, que aconteça, ou como se dizia naquela novela “cada mergulho um flash”.
E de onde
vem tanta angústia então...
Certa vez,
fui ver com alguns amigos uma montagem do Tennessee Williams, “Cat on a Hot Tin
Roof” com a Scarlet Johanssen, que atraiu muita gente ao teatro pelo nome dela.
Fui com conhecidos de uma amiga que estavam de férias por aqui. No final do
primeiro ato, eles nos disseram “Bem, já vimos, agora nós vamos para a
balada”... Eu queria argumentar, pois teríamos ainda mais dois atos. Mas eu
sabia o que aquilo tudo significava. Estavam ali só para dizer no Brasil que
viram a Scarlet ao vivo no palco. Saíram e foram para a balada.
João mostrando as situações que passa pela cidade |
Queria
achar que fosse algo deles, dois atores (sim, eram atores) aspirantes à
celebridades passando por Nova York para dizer que estiveram por aqui. Mas na
verdade, situações parecidas aconteceram outras vezes.
Meses
depois, eu levei um grupo de amigos de um amigo para o MET, o maior museu da
cidade. Eles tinham passado uma semana em Nova York e não tinham ido a nenhum
museu! Pois, na porta do museu, fizeram o “check-in” no facebook e saíram. “Já
viemos, não?”. A sensação de que haviam feito um favor para mim ficou ali,
pairando no ar...
Entre todos
esses, eu respeito aqueles que me disseram sem vergonha nenhuma que não estavam
aqui para ver museu mas para andar pela cidade e fazer compras.
Outra
característica nossa é o silêncio quando vemos compatriotas. Diferentemente dos
italianos, espanhóis, russos... que quando se encontram, conversam ou trocam
ideias, os brasileiros ao perceberem que há outros brasileiros se aproximando, se
silenciam até que o outro grupo saia de perto. Talvez seja a nossa vergonha de
talvez encontrarmos alguém como a gente mesmo: alguém cheio de sacola, que fale
alto e que não queira conhecer a cidade, só fazer compras.
Eu, mais de
uma vez, ao perceber que estavam perdidos, ofereci ajuda e mais de uma vez, eles
negaram, “não precisamos”... E eu pensava em responder – bem americanizado, com
aquele tom de seriado de televisão – “ vocês sabem que eu falo português e que
ouvi a conversa e vi que vocês estavam perdidos...”, mas ultimamente ignoro. De
raiva no começo, dei informação errada e mandei o casal feliz para as últimas paradas do Queens,
quem sabe não aprenderam que aqui não é tão perfeito como nos filmes que Hollywood vende.
Brasileiros
são reconhecidos facilmente, por mais que a gente não queira ser reconhecido de
jeito nenhum. É fácil. Óculos de sol gigante nas mulheres, cabelo com chapinha
e um tipo de luzes que só se faz no Brasil, uma cor meio amarelada que não se vê por aqui. O
homem: camiseta justa de marca que são feitas para jovens magros, calça de
marca, tênis extravagante de marca... Basicamente os dois se parecem como que
se um shopping brega tivesse vomitado neles. Pois então, nós somos facilmente
reconhecidos. E depois de cinco anos aqui, vejo de longe.
João pagando de turista II (fingindo que nem viu a foto) |
Tem ainda
uma característica que, confesso, compartilhei por muito tempo. Brasileiro disfarça admiração,
choque, estupefamento e aquela sensação de boca aberta. Eu me lembro quando um
amigo espanhol me pediu que nós nunca perdêssemos a sensação de maravilhamento sempre que víssemos o
Empire State Building (a universidade que me ofereceu bolsa é em frente). Até então, sempre que
saia do metrô eu baixava a cabeça para não ter que admirar o edifício e fingir
ser local como bom brasileiro que sou. Mas depois daquele dia, sempre que passo
por lá, olho para cima e me lembro do meu amigo e de como aquilo ainda me deixa
maravilhado. É um edifício de quase cem anos, de quase cem andares.... Mas de
maneira geral, brasileiro faz uma cara blasé quando passa por aqui, como se nada
fosse suficientemente maravilhoso (só o Cristo ou as Cataratas – mas também só quando
não estamos no Brasil). Olhamos as flores caindo no parque e não falamos nada. Hoje
eu penso, “fenômenos da natureza que não acontecem no Brasil!”.
Mas apesar
dessa falsa falta de paixão, nós adoramos tirar foto, postar, digitar, tudo
instantaneamente. Todos (ou quase todos para evitar generalizações... sim,
cinco anos aqui nos deixam mais politicamente corretos) querem, antes de mais
nada, comprar um smartphone, uma câmera e eletrônicos para registrar toda a
viagem. E assim, saem pelos parques e lojas postando tudo.
A
intermediação tecnológica está se transformando em algo insuportável. Não se
pode mais sentar em um restaurante sem que os primeiros dez ou quinze minutos
sejam com todos nos seus celulares. Eu tenho sofrido – juntamente com muitos
amigos daqui – do efeito oposto: quanto mais usam, menos quero usar.
Outra vez, com
um grupo de conhecidos, uma amiga que também mora aqui se levantou da mesa e
tirou todos os celulares das mãos de todo mundo. “Pronto, agora podemos
conversar, não?”. Situação genialmente constrangedora. Saibam que nós que
moramos aqui deixamos de fazer alguma coisa para acompanhar vocês em algum
lugar que nós não iríamos se não fosse por vocês. Sentar-se em uma mesa e ficar
postando e comentando no “face” como vocês dizem por aí, é, no mínimo, de uma
falta de respeito tamanha. Guarde o seu celular por alguns minutos e aproveite
a noite.
Em outra
oportunidade, ofereci a alguns conhecidos para almoçarmos na universidade onde
trabalho. Um deles perguntou “mas o que tem lá?”... Responder que é um campus
de quase duzentos anos, com prédios históricos, um campus universitário urbano,
uma universidade privada em que as pessoas podem andar pelos jardins (deixo a
indireta para a USP) não foi suficiente. “É, legal, quem sabe outro dia se a
gente tiver tempo depois das compras”.
Brasileiros
também tem sempre alguma indicação de algum lugar para comer “ai, tem um
restaurante excelente que eu comi uma vez, você precisa ir”. Não, querido, aquilo
é só um café/deli que tem igual em cada esquina. Mas vale a experiência que
ninguém mais teve e o prazer de poder dizer que já esteve aqui antes.
Brasileiros não gostam de ser inexperientes. Por alguma desordem confundimos o
que Jobim dizia sobre o Brasil não ser para principiantes...
Uma pena
que os “check-in” sem entrar, as sacolas de roupas de marca feitas só para
turistas, o excesso de compras desnecessárias, a grosseria com vendedores, a
subserviência com a cultura americana, o hábito de exaltar a “América” e
destratar o Brasil e outros pequenos costumes ainda são maioria por aqui. Tanto
acontece por aqui que fazem de nós, a nossa marca, o nosso jeito.
Somos um
fenômeno turístico interessante. Percebam que em todas as lojas daqui há algo
em português, mas não há em nenhum museu placas na nossa língua, isso diz muito
dos nossos hábitos turísticos.
João tentando tirar aquela foto que poderia ganhar um prêmio... |
Esses anos
aqui, me deixam, assim, entre amargo e animado – bittersweet. De vez em quando
prazeres espontâneos aparecem. Fico feliz, por exemplo, quando descobrem lugares
que não conheço. Uma vez, minha irmã veio para cá e foi a um museu/ biblioteca
particular que não tinha ido ainda. Ou quando uma amiga achou uma risoteria que
acabou se transformando num dos meus restaurantes favoritos (esse, sim, um
restaurante de verdade). Às vezes, brasileiros "me surpreendemos" e isso vale as
visitas.
E nem tudo
é tragédia cultural, não. Há coisas bonitas também. A melancolia instantânea e
a rapidez com que nos apaixonamos por coisas e pessoas faz de nós, assim meio
que únicos. Essa vontade de nos despedirmos antes de sairmos de algum lugar,
essa rapidez que algo estrangeiro se transforma em nosso (“só a antropofagia
nos une”) faz com que aquele suspiro saudoso da janela do aeroporto me faça
esquecer de todas as estripulias brasileiras em terras estadunidenses. Sempre
que volto e vejo o olhar melancólico daqueles casais que há dois dias eu queria
jogar da ponte, me derreto no pesar alegre nosso. Pena que isso fique entre
nós, porque ainda não conseguiram traduzir saudade.
Por não ter ido ainda para NY fico apenas com a sensação de que se estivesse em seu lugar diria possivelmente as mesmas coisas. Um pouquinho de compras, ok, mas o que vale uma viagem se não para sentir, experimentar, vivenciar e ficar maravilhado com cultura, paisagem e pessoas?!
ResponderExcluirÉ... As pessoas algumas vezes são... Deixa pra lá!
Gostei. Gostei muito.
ResponderExcluirFaz bastante sentido.
Bom texto.
:-D