Há um lado
radical meu que sente uma certa angústia (ou raiva mesmo) quando ouço de
conhecidos que vivem abertamente no armário lacrado que se sentem
desrespeitados com comentários como o de Fidélix. Como sentir-se desrespeitado
se a princípio ninguém sabe dessa sua parte (ou pequena parte, como dizem
alguns)? Deve ser angustiante sentir-se desrespeitado e não poder dizer o por
quê. Eu me sinto desrespeitado, não porque ele disse besteiras, mas porque ele
disse absurdos que afetam, não só a mim, mas a todas pessoas que me conhecem e me
respeitam também. O constrangedor silêncio de todos os candidatos e de muita
gente sobre o assunto nos faz menos importantes, menos relevantes e
menos cidadãos. Se vamos falar de identidades, é preciso FALAR sobre o assunto e não silenciar-nos enquanto um grita impropérios.
E eu fico
ansioso porque me parece que temos que responder a tudo que nos acontece em 140
caracteres, e com frases de efeito. E eu me silencio porque acho que ninguém
vai ler, ouvir ou se importar ou quando eu finalmente tenho uma resposta, o
assunto já passou! Não consigo ser tão breve, não acho possível e tenho medo da
brevidade das discussões hoje em dia. Reflexão não pode ser limitada, deve ser
articulada dentro do espaço e tempo que são necessários para as nossas
meditações.
E fico mais
ansioso porque é difícil responder a um indivíduo que associa sexo anal à
homossexualidade (nem vou comentar a relação com pedofilia porque não quero ter
que justificar tal vergonhoso absurdo verbalizado pelo candidato). A minha
ansiedade vem do fato que para responder a tal comentário é preciso falar de
pênis, vagina, ânus e aí, todo mundo arrepia a nuca... Precisamos falar de
sexo, precisamos falar das nossas partes... Então é melhor nem falar nada.
Pois se tal
candidato faz tais associações é preciso perguntar: Não são todos órgãos
excretores de alguma maneira? Urina, fezes... não está tudo conectado de
maneira anatomicamente superficial? E também temos que falar de sexo anal. Pois
afinal, heterossexuais não fazem sexo anal? Ou então, todo gay faz sexo anal? Sexo
anal é exclusivo para homens? Como podemos deixar um homem simplificar tanto a
experiência sexual humana... em nome de quem? Do quê?
Comentários
como o de Levy Fidelix são perigosos em vários sentidos. Eles associam práticas
sexuais a identidades gerando ansiedade e repressão em muita gente. Nos
silenciam porque nos dá medo de falar de identidades sexuais quando a única
coisa que identifica um indivíduo é sua prática sexual.
Ser homossexual,
gay, lésbica, bicha, bissexual, sapatão, heterossexual, travesti, transexual,
transgênero não é associar-se a uma prática sexual, é associar-se a uma
determinada afetividade, que pode ou não incluir atividades sexuais. Se
precisamos falar de identidade sexual ou de gênero é preciso falar de muitas
outras coisas que vão além do ato sexual. É o modo de falar, de vestir, onde
morar, com quem se relacionar... é inserção em várias culturas que são tão
diversas quanto as nossas práticas sexuais.
As frases
de Fidelix incitam ao ódio, ao separatismo e à incompreensão. Não nos ajudam em
nada como sociedade igualitária ou uma sociedade que busca igualdade entre os
seus cidadãos. Tais comentários devem ser sempre questionados, deve haver
espaço para discussão, para que essa pessoa possa ser silenciada não pela
censura, mas pela argumentação. Quanto mais discussão houver, menos espaço para
tais absurdos existirão. Lembrem-se que no passado pesquisas associaram tamanho
do cérebro à inteligência, justificando quais raças seriam superiores a outras,
que pesquisas comprovam que homens podem mais que mulheres (sim, isso ainda
existe).... é preciso espaço e tempo para que tais discursos sejam, por fim,
silenciados.
Porém,
enquanto isso não acontece, a aprovação da lei que criminaliza a homofobia é
fundamental para que sejamos, pelo menos, responsáveis pelas coisas que falamos
ou fazemos.
P.S. Como
eu disse no texto, eu preciso de tempo para pensar e refletir. Este texto veio
do calor da hora, me ajudem a corrigir, melhorar e pensar mais sobre o assunto.